segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Monkey Sapiens

Um belo dia, vendo-se refletir no espelho d'água, um peludo primata disse:
Eu ser vivo
Eu morrer
Eu você
Eu...
Ele ia ainda dizer algumas outras palavras reveladoras quando foi violentamente interrompido com uma forte paulada na cabeça, dada por outro primata concorrente que ambicionava saborear suas verdes bananas.
Seus descendentes seguiram o mesmo caminho, todos abatidos enquanto se banhavam, comiam, trepavam, dormiam, ou atacavam outros animais. Com exceção de Primata Jr. Talentoso e "diferente dos demais" ingressou na Escola primata de filosofia ainda Erectus para se tornar o maior Monkey Sapiens de sua geração.
Quando em um belo dia, vendo os demais primatas a se banharem, treparem, comerem, peidarem e se atacarem disputando verdes bananas, ele disse:
Eu ser vivo
Eu morrer
Eu você
Eu...
Ele ia ainda dizer algumas outras palavras reveladoras quando sentiu um forte arrefecimento em suas idéias e saltou violentamente do penhasco sobre os galhos e pedras lá em baixo.
Os outros primatas viram sua queda e correram para o local. Logo examinaram o corpo. Ele estava morto. Arrancaram seus membros e seus órgãos. Estavam uma delícia. Menos para um jovem cabeludo, ainda cheirando à leite de macaca. Ele viu seus órgãos, suas vísceras e seus olhos abertos como se ainda olhasse a vida e sentiu medo. Ele sentiu medo e disse:
Eu ser vivo
Eu morrer
Eu você
Eu...
Ele ia ainda dizer outras palavras reveladoras, mas faltavam palavras no restrito seu vocabulário. Na verdade aquelas eram as únicas palavras ditas até então, e ele se recolheu. Não mais comeu, não mais trepou, nem dormiu por semanas. Sempre mais distante, foi visto pela ultima vez comendo bananas pela raiz. Seu corpo sumiu pelo Eufrates, e em seu leito encontram seu diário, um punhado de papiros de banana, com mais de 100 mil verbetes escritos à carvão. Foi uma bela fogueira naquela noite.
Mas em um dia pouco belo o céu se abriu e de lá do alto do penhasco um velho e grande macaco grisalho olhava os demais a se banharem, treparem, comerem e se atacarem por bananas verdes, quando disse:
Você ser vivo
Você morrer
Você estar
Você não ser
A notícia caiu bombasticamente, e todos passaram a correr em fuga pra lá e prá, quando o velho macaco disse:
Deus fazer o mundo
Deus fazer você
Deus o dono das coisas
Deus no céu a te ver
O diabo veste Prada
E Deus salvar você
E içou duas tabuas de madeira e dizendo:
1°) AMAR A DEUS SOBRE TODAS AS COISAS
2°) NÃO TOMAR SEU SANTO NOME EM VÃO
3°) GUARDAR DOMINGOS E FESTAS DE GUARDA
4°) HONRAR PAI E MÃE
5°) NÃO MATAR
6°) NÃO PECAR CONTRA A CASTIDADE
7°) NÃO ROUBAR
8°) NÃO LEVANTAR FALSO TESTEMUNHO
9°) NÃO DESEJAR A MULHER DO PRÓXIMO
l0°) NÃO COBIÇAR AS COISAS ALHEIAS
11º)NÃO COMER BANANAS VERDES, AS EMBRULHE EM UM JORNAL
Dito isso, o velho macaco se enrolou em tecidos mande in Vietnã, desceu do penhasco e andou pelo meio do povo. Os demais primatas o olhavam estarrecidos e alguns faziam o que melhor sabiam, o atacavam, mas a cada ataque previsto o velho macaco sacudia elegantemente sua capa grená made in Vietnã os paralisando com seu brilho acetinado.
Não satisfeito, o macaco velho conduziu os infantes peludos a uma mesa posta. Louças inglesas, açúcar brasileiro, french fries, vinho chileno, hambúrgueres e refrigerantes de cola americanos, chocolates suíços, pães franceses... Tudo uma delicia.
A mesa estava posta e os convidados sedentos. Uma explosão de sabores preenchia seus paladares toscos e barrigas magras. Ninfas macacas dançavam entre finos panos ao som de um crooner inspirado em um banquinho e violão. Ah, tudo como na novela; serviço de primeira, música ao vivo, garçons sorridentes e manobristas na porta.
Em pouco tempo o empreendimento era um sucesso e outros se fixaram ao seu redor; Uma verdadeira rede de serviços. Cabelereiros unisex, cabelereiros sex, padarias que serviam pão com sementes de granola em pratos com garfo e faca, suquerias, pet shops, locadoras, academias, yoguberies... A cidade era uma maravilha.
Naquele momento todos já tinham descido das árvores, iam à Igreja aos domingos, os machos aos puteiros às sextas, e as fêmeas à hidroginástica pelas manhãs. Ninguém mais se banhava, trepava, ou peidava às vistas dos outros, nem se batiam e se matavam, não sentados à mesma mesa.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Quiromancia ou Exegese; quando os fins não justificam os meios

É só olhar pra traz e ver como o futuro é previsível

Pesquise pelas manchetes desta mesma data há exatos cem anos e você terá as noticias do dia.

Será falta de memória ou falta de coragem pra olhar nossos atos de frente?

Voltas e voltas nessa roda gigante itinerante, que roda, roda, anda, anda... Mas não sai do seu lugar.
Ah, mas tem que sair... 5cm ao ano, igual ao afastamento dos continentes, discreta e cabalmente tal qual as primeiras fissuras do Pangeia.

Ah, quem vive de passado é o presente
quem vive de futuro é o presente
mas quem vive de presente é o esperto

Não bastava atravessar a rua quando o sinal está fechado? O que mais fazer da vida?Lixe suas unhas, prepare seu jantar...
Existem rotas
Existem normas
E existem coisas sem nenhuma natureza intrínseca
... Só existem coisas sem nenhuma natureza intrínseca
Rotas, normas...

A natureza se transforma
já diziam os pré-socráticos

A energia não se finda
já se dizia no século das luzes

Mas o que só eu sei
é que só eu carrego o martelo e os pregos de minha cruz
que o meu amor é só meu
e que tudo que sou ou fui ou serei morrerá com minha carne

O que só eu sei
é que meu corpo não é só sangue e músculos
nem só alma ou idéia
vivo no enlace das mais diferentes matérias
matérias sem natureza intrínseca, repletas de normas e rotas artificiais

Id, Ego e SuperEgo...
já dizia Freud e outros industrialistas

Mas o que ele não sabia
é que fodam-se as suas teorias
pois até os mais loucos são senhores
entre as paredes de seus pensamentos

Sei que não há nada de novo em meus devaneios
ao contrário de Sócrates, Descartes ou Freud (segundo a história)
A novidade, se é que esta natureza existe, está velada em uma carta relida
em uma mensagem esquecida
a novidade é dar bom dia
mesmo que todo dia não haja nada mais tão óbvio ou elementar

...Bom dia pra você...

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

MAR MANSO ou Papo de maluco

Tudo águas de piscina. Era o que meu pai dizia.
Creio que preferiria algo mais agitado, mas certas inflamações são tolas. Lidar com a sensatez às vezes guarda armadilhas, aliás, sempre guarda armadilhas.
São inúmeras as armadilhas. Posso listá-las em ordem de lembrança:
Raiva, ciúme, solidão
Tristeza, chororô
Não, parei com o chororô, não é racional
Mas o que é racional? Viver nessas águas inanimadas?
O rebuliço é a gente que faz, sempre. E brincar com o próprio nariz sobre o limite entre o niilismo e a esquizofrenia não é tão fácil assim. Como disse, o bem estar guarda muitas armadilhas.
Criador e criatura se confundiram. Aliás, nunca foram dissociados. No dia em que segurei entre as mãos meu primeiro objeto, escrevi em mim o seu nome pra jamais esquecer a quem pertencia. Ainda olho em seus olhos às vezes, na sua vez dentre os diversos objetos posteriores, na tentativa de ratificar a quem pertenço. Nutro a confortável ilusão de ser livre admirando a artificial grandiosidade de minhas obras, obras para além da minha pessoa, obras empoeiradas pela fuligem original da Terra.
Mas todas essas idéias tortas e frases soltas só reafirmam a retórica de nossa prisão, ou, de nossa oportunidade. Sim, a existência enquanto oportunidade. Ato que rasga o nada, o abre, o disseca, o revela, o destrói, ou ... Apenas nos ilude de não sermos qualquer matéria rala e vulgar. Ou ainda, de não sermos essa anti-matéria unívoca e universal.
De fato, são questões irrelevantes, posto que nenhuma pedra se moverá ao ouvir qualquer resposta. Mas afinal, o que meu pai e seus ditados têm haver com isso tudo?
Têm haver que toda essa pseudo reflexão sobre o próprio umbigo se abriga nesse tédio racionalizado, nesses 28° à sombra, nesse domingo e todo o resto do calendário Cristão-burgûes; Se abriga nessa falta de troféus e de outros objetos inventados, nessa falta de AMOR (Anti Morte por Razão)
É...A estante está vazia, como sempre esteve, mas mais nua, mais crua, mais verdadeira em suas mentiras pra esfregar na vaidade desse réles preterido os excrementos de seus ídolos igualmente mentirosos.
Bem, mas estamos aqui, em mais um piquenique, ilhados em Strombali, indecisos entre piroclastos e confetes. E como diria A foca e o carpinteiro ou na história das ostras curiosas: A morte é certa, a vida é bela, e o sol está a brilhar.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

FOI (Future Options Intelligence)

De repente você passou
você, que você?
você não existe mais

Massageio entre os dedos dos pés e caminho com minhas novas sandálias couro cru
Lavo o rosto com sabonete antibacteriano e pago 55 reais num corte e hidratação

Leio ebooks, baixo videos, ouço bandas desconhecidas...

Desejo
toco
durmo
canso
vivo

às vezes choro
sim, ainda vivo

De repente o passado passou e levou a própria falta com ele
Fato que às vezes bate saudade
e anoto no espelho mais uma idiossincrasia
Sim, ainda vivo
e passo
como passa todo enredo

Mas se por um acaso um dia passamos nós
Pelo acaso passeiam pássaros em rotas aleatórias
Pela matéria passam transformações compulsórias
Pela trama passeiam passos em novas velhas histórias

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Ultrapassagem

Desamor
Desbalanço de ambições
ULTRAPASSAGEM
desbalanço de tempos

Como se o tempo fosse um só
não, isso já é quase consenso, o tempo não é linear, ele não existe
O que poucos sabem é que além disso, ele é vários e todos em potência

Os passados repassam,
Os presentes se ausentam
E futuramente tudo está bem aqui

Enquanto um agora estendido me grita a mesma coisa
um futuro delgado tenta me convencer da mesma outra coisa
ULTRAPASSAGEM, ULTRAPASSAGEM
mas o agora... Não dissolve, não tacitamente

ULTRAPASSAGEM...
o tempo existe, eu insisto,
vamos ver qual eu desisto

ULTRAPASSAGEM
Um qualquer ontem me visita, com óculos de sol e peruca, ontem mesmo usava batom, ante-ontem penteava o bigode

O ontem me repassa
ULTRAPASSAGEM
eu me repasso
ULTRAPASSAGEM
por várias vezes
ULTRAPASSAGEM
janela
break
IMAGEM
MOLDURA
E um grito tão belo quanto tolo se fez ouvir por poucas milhas
retórno
não tenho as chaves
não tenho as portas
não há paredes
abraço ao léu
não há barreiras
não há bandeiras
não há cadeiras
só velocidade
só a fome da necessidade
ULTRAPASSAGEM