terça-feira, 23 de junho de 2015

Ressaca em Copacabana - Uma Marinha Read Made para Dona Teresinha

Abril de 2015, uma tarde ensolarada. Saio de casa com uma bolsa pesada rumo à tradicional Sociedade Brasileira de Belas Artes.  Na bolsa, minha mais estimada obra, “Ressaca em Copacabana”. O tal retrato, pesando bastante na tal bolsa, ainda precisaria ser montado para fazer parte da exposição daquele mês.
Chego  na Rua do Lavradio nº 84, na confluência da Rua da Relação com a Avenida Chile, na Lapa, eis que entro o Solar do Marquês do Lavradio, onde  há 40 anos abriga-se a Sociedade Brasileira de Belas Artes. Falo de meu desejo de expor um trabalho ali. A atendente puxa uma ficha e informa que são R$ 95,00. Digo ok, mas que antes precisámos ver como se daria a exposição de meu trabalho, tendo em vista que não era uma tela bidimensional. A atendente diz, então conversa com a Dona Teresinha.
Dona Teresinha, 83, administradora, curadora, marchand e critica de arte. Me apresento e digo de meu desejo de expor meu trabalho alí. Faço ressalvas em relação à montagem. Logicamente, ele precisa ver o trabalho. Tiro as “coisas” da bolsa. Ela olha com rápida curiosidade. Vou tirando os copos, a garrafa de água e a de areia. Disponho os copos em linha reta sobre a prateleira envernizada. Primeiro coloco um pouco de areia no fundo de cada um, depois pego a garrafa de água salgada e jogo no primeiro copo. Os grãos de areia sobem formando um curto e translucido redemoinho, ela diz algo: que isso? Que vai acontecer agora? Nada aconteceu, Dona Teresinha. Termino de preencher os 3 copos com areia e agua do mar. O Redemoinho foi breve, agora a maré descansa. Dona Teresinha olha para a obra. Nada aconteceu, Dona Teresinha, nada aconteceu.
- Então, mas e ái?... Esses copos estão quebrados, você sabia?... Olha, não tem como expor esse trabalho. Como vou colocar isso na parede se o prédio é tombado e não pode furar as paredes (se referindo à prateleira envernizada que dá base à obra). Desculpe, mas não tem como.
- Eu posso adaptar a base e voltar. Vocês tem o calendário de salões?
- Sim, aqui está.
- Ah, então vai ter o salão da Marinha em junho. Vou adaptar o suporte e volto com este trabalho para o salão da marinha.
- Minha querida, no salão da Marinha você não pode participar.
- Mas porque não?
- Olha, eu respeito seu trabalho, entendo sua ideia, mas se você quiser você pode participar do salão de arte decorativa.
- Mas meu trabalho é uma marinha, logo, o ideal é que ele participe de um salão de marinhas.
- Não, não tem como ele entrar no salão de Marinhas.
- Mas eu vou trazê-lo para ao menos ele ser submetido à seleção junto dos demais trabalhos.
- Esse salão é um salão importante onde recebemos todo o apoio da Marinha. Se eu botar esse trabalho os oficiais vão pensar que eu tô de piada com eles.
- Mas a senhora pode ao menos levar este trabalho até eles para que então decidam.
- Querida, eu não vou importunar os oficiais da Marinha com uma “coisa” dessas.
- Bom, então eu vou até o Comando do 1º Distrito Naval, o edital não e público?
- Menina...  
Dessa vez o tom estava bravo
- Se você passar por cima de mim você nunca mais entra nessa Escola, ouviu?
- Mas o edital não é publico? O salão é do primeiro Distrito e a curadoria também, não?
- Não, quem organiza o salão sou eu.  O primeiro distrito nos da uma verba para fazermos um coquetel e eu não vou importunar os oficinais com isso.
Quase 5h da tarde, 1h depois de minha chegada. Os funcionários se movimentam para deixar o expediente. Dona Teresinha continua
- Minha filha, você é teimosa, mas eu sou mais. Sabe quanto anos eu tê nesse ramo? Há 40 anos.  Você estuda artes?
- Sim, na Uerj
- Isso é o que? No Fundão?
- No Maracanã
- Hum, chega um monte de alunos do fundão aqui, não sabem nada, não sabem volume, perspectiva, a gente que ensina tudo. Olha, tá vendo aqui (uma pilha de fichas), aqui é organizado, não é aquela bagunça de Parque Lage, não.
- Ok, Dona Teresinha, vou mudar a base do meu trabalho e volto aqui para sua apreciação.
Fim.

Um comentário:

  1. Água mole em pedra dura tanto bate até que fura. Rsrs. Mas como terminou a história? Conseguiu expor seu trabalho
    ?

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