segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Um bom banho de banheira

Há algum tenho tido a ideia fixa de tomar um bom banho de banheira. Você deve imaginar que um banho de banheira não deva ser uma coisa que qualquer um faz todos os dias, não é um prazer tão acessível para as pessoas, muito menos pra mim. Mas devia ser. As pessoas deveriam ter direito a este prazer. O vale cultura deveria valer também para moteis somente para que as pessoas pudessem tomar um banho demorado numa banheira. De preferência de água morna. Sim, por que a água tem estar morna. Nem quente, nem fria. Morna. Invejo muitíssimo as regiões do mundo onde as casas já vem com uma banheira. Comprou a casa, ganhou a banheira. Muitas das casas aqui não possuem sequer um banheiro decente. As pessoas não entendem o valor de uma banheira.
Existem maneiras de tomar um bom banho de banheira. Para todas é necessário um ambiente ligeiramente silencioso. Não tem nada a ver com a besteira de hidromassagem. Hidromassagem não existe. A banheira te massageia, fazendo pressão na água de todas as direções sobre toda superfície do seu corpo. Isso é um banho de banheira. Hidromassagem só serve pra sexo.
Um banho de banheira é um processo meditativo. Ali você está o mais próximo daqueles maravilhosos noves meses que você passou submerso na água quente, naquele leve movimento. Na barriga da sua mãe.
Deve-se entrar na água lentamente, primeiro com a ponta do pé, como você vê nos filmes. A água não pode estar na temperatura ideal. Tem que estar mais fria que o ideal e cheia em pouco mais da metade. O choque térmico é o momento em que o seu corpo entende que ele não está mais no ar. Está água. Desansando.
Depois de entrar é muito importante relaxar. Seu corpo deve estar muito calmo para abrir a torneira do “quente” com precisão. Nem muito, nem pouco. De leve. Você pode sentir a água quente fazer alguma corrente. Finja que não é com você! Ao aquecer feche. Depois abra a “fria”. Depois feche. Abra. Feche.
Nunca tomei. To doida pra tomar.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

4h13. segunda noite de insônia

LEVANTOU DA CAMA pela terceira vez e foi até a cozinha. aquela era a segunda noite consecutiva em que arlindo não conseguia dormir. olhou pela janela. lá longe ele via a praia, mas o barulho era de uma cidade que parecia não dormir. pegou um copo de leite, ia colocar açucar e pensou "açúcar vai te fazer ficar acordado, estúpido".
segurava o copo, mas nao bebia. apenas olhava pela janela. erguido. com o copo na mão. na sua cabeça, uma dúvida: "coloco ou não açucar?"


COLOCOU AÇÚCAR. Resolveu não voltar pra cama. aquela mulher que estava deitada lá não merecia dormir junto de um ser insônico rolando de um lado a outro. notem que eu chamo de "aquela mulher" sem querer com isso diminuir a importancia da mesma ou expressar sentimento de desdém por "aquela mulher", mas é que nem mesmo arlindo sabia direito se ela era sua esposa, amante, namorada, irmã, empregada, vadia ou apenas um corpo qualquer, indiferente, amarrado à sua propria vida por um estúpido anel colocado no dedo de uma específica mão, que arlindo nunca se lembra exatamente qual é.


VIROU O ÚLTIMO GOLE de leite, acendeu um cigarro, ligou o computador e colocou o pau pra fora. não era sempre, mas arlindo consumia conteúdo erótico adulto. material muito tradicional. nada com animais, excesso de gente na mesma cena, exageros nos atributos fisicos, etc. acariciava-se vendo fotos e filmes de casais fazendo o sexo mais sem graça do mundo, como o que ele e aquela mulher deitada na cama do quarto, onde ele agora deveria estar dormindo, costumam fazer quando bebem algumas doses de pró-seco brindando o pré-sal.


APAGOU O CIGARRO. parou de se masturbar. os casais nos filmes gemem e gozam porque não são obrigados a ouvir barulho de carro e motores quando, lá no fundo, o que se vê, são as ondas quebrando nas pedras. eles fodem porque nos filmes eles não envelhecem, não existem mentiras, nos filmes as mulheres te olham quando estão te chupando, lá não existem problemas e não há preocupações. 
na verdade o problema é que arlindo sabia que filmes são apenas histórias. 


4H53. segunda noite de insonia. foi ao banheiro gozar e depois tentar dormir.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Num Canto qualquer

Canto
E num canto qualquer isolado do mundo
Quero apenas os não olhares dos amigos ou amores
Canto o exílio
Exílio para aqueles que não brindam mais
Exílio num canto sem letra
Exílio de cordas chorosas e declarantes
Canto o delírio de um mudo em prantos
E mudo o canto de um pássaro em queda

terça-feira, 10 de agosto de 2010

tem mais de duas horas que estou diante da tela em branco tentando pensar alguma coisa legal pra escrever aqui. drica, fabi e eu não definimos que este seria um blog de contos, mas fiquei preso ao formato depois de ler o que as meninas escreveram... tentei contar uma história que fosse uma parábola dos meus últimos dias, não ficou bom. tentei desenvolver um rascunho que fiz durante a semana, ainda não tá bom também. tentei achar uns textos antigos, republicar alguma coisa boa escrita há dois, três, cinco anos... os cadernos velhos simplesmente desapareceram...


a última semana foi realmente confusa. sei que vc leitor esperava encontrar um novo conto por aqui, mas tudo o que posso contar é que a cabeça está a mil por hora, pensamentos dispersos, pipocando aqui dentro. e, pra que a fila ande, eu precisava escrever algo. regras, elas harmonizam o caos e fazem dele o que ele é.


como é de imaginar, existe uma pressão para que eu publique algo. este foi o acordo.
recebi uma ligação ontem pela manhã, uns dois torpedos e ainda um e-mail.
o combinado foi claro: a fabi postaria o primeiro texto, a drica ficou de colocar a segunda atualização e como somos apenas três participantes neste coletivo, foi subentendido que o próximo seria eu.


mas... o que escrever? talvez apresentar a ideia do blog? ah, mas isso é assunto pra primeiro post e a fabi optou por não fazê-lo.
sem contar que somos ainda um blog sem rumo, talvez de contos, mas ainda sem rumo. a única regra é de atualizarmos um post por vez, seguindo uma fila indiana de produção literária.


e to eu aqui, na fila, de cara pro gol, sem conseguir ajeitar a bola pro chute.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Clarinha

Eu não andava de bom humor. Fazia com freqüência aquelas frases...como é que e o nome disso? Aquelas frases meio determinantes...sabe? aquelas coisas como “não é que eu não goste da minha cunhada, o que eu não gosto é de gente burra”...esqueci o nome disso. Tava ficando igual a minha mãe, mas um pouco mais triste. Cansado. Tirei o casaco assim que cheguei e dei um beijo nela. Óbvio que ela não falou nada. Há dias trocávamos apenas bom dia, oi amor e boa noite. Chegávamos ao estágio de que não adiantava muito conversar, já estava tão puto, nem isso eu queria. Férias talvez...uma viagem. Um final de semana em búzios, na praia, de frente pro mar. Comendo mel com torradas e uvas no café da manhã. Um maiô novo pra ela...Com que dinheiro? As vezes eu esquecia completamente de que era fudido. Alias, no passado não. Eu sou fudido. Uma situação que estende na minha vida. Nunca soube juntar dinheiro, fiquei velho sem ele. Mas também tava frio, eu ia viajar pra onde. Só se fosse pra Pavuna, de novo.

Fiz menção de deitar, pra descansar. Iniciar o processo sofrível de tirar item por item de cima da cama e afastar os cinzeiros fedorentos dela. Completamente maluca essa mulher. Incrível como alguém é capaz de fumar tanto e tomar suco de couve com laranja no final de semana.

Há dez anos ela fumava sem parar. Minha gastrite crônica sempre me impediu de desfrutar deste prazer. Aliás, a gastrite também me impediu de tomar alguns porres e de ficar mais de 40 minutos com um chiclete na boca. Até que agradeço. Mas, na hora de deitar desisti. Achei que seria divertido ver um pouco de televisão. Ledo engano.

Fui até a varanda para afogar as plantas. Elas já estavam molhadas, mas eu já estava com o pote cheio de água na mão, achei mais coerente derramar tudo nelas do que jogar fora na pia. Pura preguiça. Ela estava no banho, ouvindo música no radinho. Quis entrar. Entro, não entro. Da última vez tomei um esporro. Estava um frio do piru e agente sem cortina. Cheguei lá com a mão gelada no meu pinto quente. Deixei a porta aberta. Ela disse que não era assim, pra começar de novo, do início e me mandou fechar a porta quando sair. Quando sair? Saco isso nas mulheres, sabia? Sempre começar do início não dá. Agente já no meio e eu tendo que começar pelo beijo no pé?! Depois do banho o pé dela estava gelado e meu pinto mole. Desisti.

Dessa vez eu ia entrar, não custava arriscar. Bati na porta. Ela não ouviu. Ela fingiu que não ouviu, pêra aí, ela não estava ouvido o Pavarotti. Bati e ameacei entrar. Entrei. Que foi? Que foi o que? Por que você entrou assim? do nada? Silêncio. Aconteceu alguma coisa? Não, vim ver você.

Ela jogou aquele cabelão ruivo pra fora da cortina. Odiava o cigarro, mas amava aquele cabelo. Queria ele o dia inteiro. Mal sabia ela que eram aquelas imperfeições, nas quais ela era fissurada, que eu mais amava. Costas grandes pro tamanho dela, corpo forte. Não era aquelas mulherzinhas magrinhas, gostosinhas, tipo bem-sucedidas. Ela era só uma mulher. Ou melhor, era quase uma mulher. Ela me olhou de daquele jeito. Vi que ela queria. Entrei no Box com ela de costas. Beijei sei pescoço. Enlacei sua cintura. Peguei no seu pênis. Ela deixou. Ah, Clarinha.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Um certo desjejum salgado

O braço já dormente acorda o homem incomodado, que com dores no corpo por passar a noite encaixado numa estreita cama, se arrasta por debaixo de outro corpo, o mesmo corpo protagonista de seus sonhos mais recentes. Franzino e frágil, o tal corpo se enrosca com muita delicadeza àqueles braços cansados e frouxos de sono, a ponto de ser complicados demais aquela separação e o despertar para as coisas do dia. E assim, metade com sono, metade desperto, o homem vai ao encontro dos mesmos cachos, cheiro e pele com os quais cortou a noite.

- Acorda.

Sussurra o sujeito entre pequenos beijos ao redor daquela orelha de pontas avermelhadas. Uma pequeníssima e rala pelugem recobria a face de sua menina, dando-lhe um aspecto macio e aconchegante. E tal qual a orelha, nariz e lábios também eram bem rosados. Olhava com carinho aqueles lábios, nariz e orelha, tão rosadinhos, mas que ora se faziam avermelhados, ora laranjas... Tudo dependia daquela diária e pontual luz quase amarela que se espalhava pelo quarto. Mas por mais que a preguiça e as gostosuras da cama lhe prendessem ao sono, seu sonho já tinha se dissipado e não tinha mais como retornar a ele, ao menos não por hoje. Era hora de levantar, ou melhor, de despertar, e tinha a missão cruel de dar fim àquela noite. Um novo dia se levantava e todos nós estávamos convocados. Mas como acordar aquele outro ser, se nem ele estava certo de sua sobriedade?

- Acorda.

Sussurra o sujeito entre pequenos beijos ao redor daquela orelha de pontas avermelhadas. Mas estranhamente a moça rola sobre a cama e abraça o travesseiro, se fortificando beata por detrás do lençol repuxado. Seus quadris, para surpresa do homem, se fixam distantes e alheios a sua presença. Ossos, carne e pele, por ora nada lembram os lascivos convites, que quase naufragaram na noite anterior aquele sujeito de poucas mãos. Coincidência ou não, um vento rasteiro entra pela fresta inferior da porta. O lençol é fino. O quarto azula-se. Faz frio. A briga pela coberta e pelo lugar à cama perde o tom recreativo de horas atrás, parece que as coisas se tornaram sérias demais. Já se levantaram as trincheiras, o que falta para o conflito? As primeiras sansões já foram impostas, e em seu mundo onírico o homem não mais sentia aquele cheiro de pele feminina. O cheiro que lhe impregnava tinha sal e água e parecia mesmo que tinha tirado o dia para lhe afogar. De olhos fechados, o pobre sujeito tenta voltar ao sono. Quem sabe aquela manhã não passou de uma má continuação de seus sonhos, ou um olhar sonolento sob a luz errada?
Mas o sono não vem. E o pensamento não sabe driblar as perguntas lançadas por aquele corpo rijo, branco, frio e reservado, ali bem colado ao seu. Entediado pelo sol, há horas invasor do quarto, desiste de acompanhar o sono daquela mulher, de quadris rijos e emburrados.
Vou sair. Pensou o sujeito se desvencilhando de sua compartilhada nudez. E frente às obviedades, não tinha mais o que se perguntar, apenas voltar ao cotidiano.
Levanta da cama, escova os dentes, se veste, se calça e sai. Elevador, portaria, bom dia, faixa de pedestres e mais passos vesgos.
Mudo e com calafrios, estala sentado os dedos dos pés, e surpreso só então percebe seu paradeiro: de frente a um poluído mar urbanizado, mergulhado em gelados versos.